Toti

Eu nunca me considerei uma pessoa nostálgica, porém, isso tem sido um assunto bem recorrente nos meus últimos meses. Talvez por estarmos em meio a uma pandemia, onde eu mesma sinto a falta de abraços sinceros e olhos nos olhos durante as conversas mas, convenhamos, é algo realmente atípico.
Essa semana estava conversando com uma amiga de infância que disse estar com saudades das nossas conversas e dos bilhetinhos que trocávamos durante as aulas. Lembrei, ri, falamos que a época era boa, não existiam boletos nossos, nossa maior preocupação era não perder o capítulo de Chiquititas e aprender as coreografias. Concordamos que foi um tempo muito bom, mas ela falou: que vontade de voltar nesse tempo.
E eu? Eu não!
E vejam, já martelei aqui que embora eu tenha alguns traumas, eu fui uma criança e uma adolescente  feliz. Eu sou um bingo de privilégios. 
Minha primeira crise de ansiedade foi aos 17 anos e lembro que eu só conseguia chorar e chorar. Fui ao médico e simplesmente entrei em desespero porque tinha esquecido a carteira do plano de saúde em casa. Na hora eu pensei que nunca mais ia parar de chorar. Era sem sentido para quem via. Era sem sentido pra mim também, mas aquilo me doía o suficiente para eu chorar sem parar. 
Num pensamento pessimista, essa ansiedade furtou quase 16 anos da minha vida porque minha última crise de ansiedade foi há 4 dias, agora com quase 33 anos e tudo que vivi nesses 16 anos não foram suficientemente bons para eu ter saudade. Mas eu mesma não sou negativa a este ponto. Olhei meu facebook, em álbuns que nem deixo aberto, é só pra armazenar fotos, e eu vivi muita coisa divertida, engraçada, fiz muitos amigos e fiz uma história divertida pra contar pra quem quer que seja.
Talvez eu tenha sido ansiosa por muito tempo que não consigo mais olhar para o meu passado com carinho por estar habituada a sofrer com o excesso do futuro. Não é um bom hábito para se adquirir, sabemos. E também porque muitas e a maioria das pessoas que estão nas minhas lembranças já não estejam mais na minha vida de algum modo, então, lembrar sozinha fica sem graça em alguns momentos porque lembro de como eu acreditava que as coisas eram boas, acreditava nas pessoas e que nada disso mais faz parte de mim, como se eu fosse um brinquedo que se quebrou. Parece triste, mas na verdade eu vejo as pessoas que ainda tenho na vida e eu prefiro estar com elas agora, vivendo novas situações e lembrar juntos de histórias. Eu me vejo sendo muito melhor companhia hoje que antes e é isso. 
De 16 anos pra cá a ansiedade, antes disso a adolescência onde eu tinha vergonha de usar regata para não mostrar meus braços, o não querer sair nos rolês de família ou com amigos porque eu teria que me arrumar e nenhuma roupa que eu tinha eu realmente gostava porque era roupa de "gente gorda". E é isso que me faz não querer voltar no tempo também.
Lembro que em 2009 meus colegas estavam ansiosos, extremamente ansiosos, para a nossa formatura. Eu? Eu estava desesperadamente ansiosa para o dia pós formatura, onde tudo já teria passado, onde eu teria que começar a estudar para a prova da OAB que eu acabo lembrando mais da minha formatura pelas fotografias e pelo que meus amigos e colegas contam quando conversamos do que por eu ter vivido aquele momento. 
Vocês sabem o que é assistir a própria vida passar diante dos olhos? Eu estava lá, eu fiz a história mas minha cabeça não. Eu tenho sentimentos pelos dias que vivi, mas minha guerra interna não quer viver novamente os conflitos.
Existe um coração trincado partido ao meio
Existem meios e existem fins
Há demônios em mim cantando
Em coro alegre
De ontem em diante (obrigada pela frase, Anitelli) eu acho que comecei a ter nova visão das coisas depois de uma sessão terapêutica bastante esclarecedora (aliás, façam terapia!) que eu sei que não poderei mais ser a mesma pessoa depois disso tudo.
Se me assusta? Sim!  Mas eu to em busca de viver minhas experiências, de estar com minha cabeça no hoje, de nunca mais sentir falta de ar, aperto no peito, a língua amortecida, achar que vou morrer sozinha. Eu já busquei inúmeros tipos de ajuda pra parar de alimentar meus monstrinhos internos que se alimentam da tristeza. E a nostalgia me leva à tristeza.
Busco viver de um modo que meu passado não doa pra eu poder visitar de forma leve. Quero me livrar das culpas que carrego pelas escolhas que fiz. E isso vai levar um tempo, porém, nesse mesmo tempo eu quero apreciar o meu caminho e em algum momento conseguir sentir novamente minha respiração e meu coração batendo no peito. E vejam: eu acho que estou indo bem!